sexta-feira, 28 de outubro de 2011

McCullin em uma quinta a noite

Quinta à noite, voltei de uma entrevista Fail com a Camila e o Murilo. Cheguei em casa, tomei banho, deitei na cama, pus o Pancho em cima da barriga e constatei que ele já tava mais pesado do que no dia em que chegou aqui, e percebi que seriam mais poucos dias que conseguiria colocá-lo em cima da barriga e ver Tv, escutando seu ronco, Pancho ia ficar mais gordo e eu morreria sem ar com ele em cima.

Então, zarpeando pelos canais da TV aberta, com um certo ar de tédio, com preguiça de vir aqui e escrever sobre algum fotografo que provavelmente seria um aleatório, eu tava sem vontade, sem inspiração, pronta  pra um escrever automático. Quando me deparei com uma cara conhecida. Sabia que sabia quem era, mas não lembrava. Era no Canal Brasil, uma entrevista. O homem dos seus 60 e poucos anos, falava sobre guerra, destruição, dor, o quanto isso não saia da sua cabeça. Quando o seu nome apareceu embaixo: Don McCullin.


Don McCullin foi/é (está em um momento, segundo ele mesmo, bastante contemplativo dos feitos da sua vida, e do que isso significava para ele) um fotógrafo que se dedicou ao registro em áreas de conflito, guerras, guerrilhas, lugares em que a eminencia da morte estava em cada suspiro. O senhor com os olhos cansados renega a guerra, trata a sua arte como ar de inutilidade, 'Nunca consegui parar um guerra com as minhas fotos. Ninguém nunca conseguirá'.

O entrevistador pergunta, ingênuo, o que ele diria a um fotógrafo iniciante, como chegar ao seu patamar de excelência, o que fazer para ser um bom fotógrafo. McCullin desafia a fotografar o belo, a paz, o singelo. Segundo ele, a destruição está em todo lugar e é, de fato, inútil e fácil de ser vista e fotografada, é deveras fácil fotografar guerras, o sofrimento e a dor nessas situações, as fotos de impacto afloram em todos os cantos. McCullin diz que dormiu entre cadáveres, que amigos foram presos, que milhares de fotógrafos morrem em conflitos só no desejo de tirar boas fotos e ficar famosos com isso. Para ele, isso não vale a pena, nunca valeu, vive assombrado diariamente com o que viveu. McCullin relata que ao revelar as fotos, quando a imagem surge no químico, sua mente é perturbada por tudo que viu, que presenciou, os cheiros, os barulhos, os choros, as dores.







O que me prendeu foi a verdade que emanava dos seus olhos. Aquela verdade de quem já viveu suficientemente tudo que, talvez, a alma aguente. McCullin diz se manter na linha tênue que o mantem entre a sanidade e a insanidade, e que somente por isso ainda não enlouqueceu pelas coisas que viu. Não duvido.



Pesquisei sobre a sua obra e quem era, e descobri que Don abandonou o fotojornalismo em áreas conflituosas, depois do abalo de ver a morte de uma mulher que fotografara momentos antes. Foi uma explosão de um carro bomba no começo dos anos 80.

McCullin tem diversos prêmios, os mais aclamados. Tem o reconhecimento de toda uma área de fotojornalismo, e todo um segmento de fotógrafos que buscam as fotos mais impactantes de guerra para fazer um 'nome'.

O que vi foi um homem profundamente marcado pelo que registrou. Marcado profundamente pela sua paixão em fotografar e pelo que foi obrigado a ver para isso. Senti a dor dele, inexplicável em alguns momentos da entrevista, em que McCullin se mantinha calado, estático, perdido na própria mente. O momento em que o homem está se afogando no seu passado, e que seu poder de esquecer é irrisório perto da quantidade de traumas na alma.


Sugiro que vejam a entrevista, entretanto não achei na internet. O programa era Conexão Roberto D'Avila com Don McCullin. Gostaria de disponibilizar, mas não encontrei.

Enfim, fotografia fascina, encanta, pode até apaixonar e mostrar o melhor do homem, como também provoca danos terríveis em quem a faz, pode mostrar o pior que temos como 'humanidade', pode nos fazer refletir, mas não acaba guerra nenhuma, nisso McCullin está mais do que certo.








Ps.: McCullin fez algumas fotos paralelas ao fotojornalismo de guerra dos Beatles e de outras pessoas famosas, mas em frente a essa entrevista achei que não cabia acrescentar isso no corpo do texto.

Um comentário:

  1. Muito foda!
    Não sei o porquê, mas temas de guerra me fascinam. E fotos de guerra, embora mostrem cenas horríveis, são muito lindas. Acho que é porque mostra as pessoas com seus sentimentos mais sinceros: medo e dor.

    Ótima dica! Procurarei o documentário.

    E o mais engraçado é que, recentemente, eu tinha lido um post e visto um vídeo sobre outro fotógrafo de guerra, o James Nachtway. Foi até no site que tu me indicou!
    Segue o link
    http://fotografeumaideia.com.br/site/index.php?option=com_content&task=view&id=1874&Itemid=1

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