sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Grotesco, você.

Joel-Peter Witkin apropria-se da imagem radicalmente. A densidade do seu trabalho e do seus temas é deveras ‘polêmica’ e de uma transgressão magnifica. Há inversão do ‘eu’, do espelho, revelando toda a deformidade do homem e a identidade transfigurada, velada.

Joel-Peter tem as raízes em Bakhtin, e a sua noção de ‘mundo às avessas’. Patologicamente Witkin leva a inquietude e ao estranhamento, com suas imagens escatológica e fantasmagóricas, o lado obscuro de qual tentamos fugir. A presença do grotesco permite um choque brutal do que é considerado ‘belo’.

Witkin utiliza-se do que é chamado para Bakhtin de rebaixamento. Desloca e profana obras clássicas que utiliza como refrência, dialoga com o sexo, com o escatolófico, com a carnalidade e com a efemeridade das coisas. Contrapõe vida e morte, grotesco e sexo, explicita também, uma sexualidade híbrida ao utilizar modelos.

As Três Graças de Witkin

As Três Graças de Rubens

Influenciado, também por Goya, confronta o real através da transgressão do belo, propõe um contra fluxo ao que é comercialmente belo e com os pesadelos mais frequentes do seu ‘inferno’ pessoal. Na arte ‘contemporânea’ não é necessário que se pareça ‘arte’, e na verdade, creio que o conceito de arte além de ser escorregadio, é deveras pessoal. Não há como legitimar o que é arte, nem como devemos compreendê-la. Simplesmente, sente-se. O estímulo visual atual que nos anestesia e refresca nos põe em uma zona de conforto que é covarde. Fabricam-se hábitos de consumo nada desafiadores. A arte não precisa ser positiva, nem a beleza. Por isso, quis mostrar Joel-Peter.

“Se você não se desafia… digo, quebrar as regras para produzir algo bom e novo.”
Witkin na estrevista linkada abaixo.

Joel é um apostador visual. O seu trabalho é detalhista, e cada fotografia nasce de um esboço rabiscado em papel, passa por uma etapa longa de produção, quando Joel-Peter busca os modelos e objetos necessários para a composição, passa, depois, por diversas horas no laboratório trabalhando no negativo, e depois maltrata o resultado com químicos para dar o aspecto de degradação, comum em seu trabalho. O sépia e preto&branco predominam.

Le Brasier 1982
A procura por uma composição que sirva perfeitamente, e por ‘objetos’ que se encaixem na sua estrutura previamente pensada, não consigo ver só defuntos, há muito a ser visto. Cada vez que ele modifica, ‘magoando’ o suporte principal (foto) para formar um quadro grotesco e agressivo há algo de idílico, do sonho, do simbólico, no qual o receptor da imagem ou se sente extremamente liberto no confronto ao espelho de quem é, ou apenas há repulsa. Repulsa esta, que deve ser despida ao olharmos o trabalho de Joel-Peter.

O olhar em uma obra passa pelo universo subjetivo de quem a contempla. Witkin é um provocador, talvez não tão autêntico quanto Goya, mas provoca mal-estar nos olhos já acostumados. O autor dialoga com o que é considerado por beleza e pureza, invertendo os conceitos mais comuns. Questionam sua sanidade, seu gosto pelo sadomasoquismo, sua possível esquizofrenia pela utilização de cadáveres para a composição. Eu questiono a imagem de beleza atual, em que a qualquer custo introduzimos ao nosso corpo objetos (silicone, próteses e etc) para melhor nos satisfazermos visualmente, na constante briga com o eu espelhado. O corpo como objeto de exposição de Witkin não é distante da realidade, não é um trabalho com freaks. O feio e belo tendo, então, o corpo como única moeda do que se é, como a única face verdadeira. O grotesco de Witkin dialoga com a importância de confrontar o perverso. Não devemos ter olhos somente para as garotas de Ipanema.

The Result Of a War - 1984

Portrait of a Dwwarf - 1987

Woman Once a Bird 1990



Se alguém se interessou: uma entrevista e um livro.

Um comentário:

  1. CARALHO, que fotos grotescas e geniais. Todo esse post me fez lembrar de uma citação, que não me lembro de quem é, mas que faz todo o sentido. "O medo diz muito mais que a verdade, pois não se preocupa com o mundo e sim com o subversivo dele." Foda, foda, foda.

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