segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Trilha Sonora


Meu pai, que estava passando por trás de mim, teve daquelas coisas que posso dizer que saiu do caminho que estava seguindo e se inclinou se apoiando nas costas da cadeira em que eu estava apoiado. Eu estava escutando Arnaldo Antunes pelo computador.


Ele disse, balbuciando mesmo, Esse aí sabe o que tá falando. E ficou ali mais um tempão, sem nem mesmo falar comigo. Acho que sempre foi um pouco difícil compartilhar os mesmos gostos com o pai. Eu tava me sentindo muito vazio, e aquela música me reconfortava dando algo para colocar naquele vazio. Esperança, talvez - ou um monte de merda. Interessante era o meu pai escutando isso. Agora eu estou pensando, porra, será mesmo que a Elis tá certa? A gente e os nossos pais não é assim tão diferente?


Um dia parei para colocar num papel as coisas que eu queria realizar em... não estabeleci um prazo. Prazos enganam. A pressa em resolver tudo dentro do prazo, principalmente naquilo que tange à própria vida acaba dando lugar á própria realização do projeto. O tempo faz esquecer o que nos trouxe até aqui. Prometi a mim mesmo saber tudo o que conseguiria estudando tudo em Física, ler tudo o que eu podia de Machado de Assis e pra fechar com chave de ouro, viver uma paixão enlouquecedora.

Eu realmente não sabia muito bem o que fazer. E isso me pareceu o mais lógico, sabe? A gente sempre sabe que sabe um pouquinho, mas tudo o que a gente vê na rua é a gente cometendo o mesmo erro, como se não soubesse de nada. Fui começando, então, tentando saber de alguma coisa.


No final, acabei cursando Engenharia, comprando logo a Antologia de Machado de Assis, porque todos aqueles livros pequenos juntavam muita poeira, é sempre melhor ter antologias, ficam mais bonitinhas na estante. A vida toda de um autor em 4 volumes. É bem bonito de se ver. Em relação ao terceiro ponto, bem, até hoje procuro minha sanidade pelas esquinas.
É aquela coisa, sabe? Por um momento aparece uma sensação que você chegou num ponto de uma estrada sem saber mais ou menos como foi parar lá. De repente estava, quando deu por si, já tava um pouco mudado, num lugar diferente.


Sabe... quando finalmente sabia resolver tudo nos livros de física do ensino médio, quando só faltava os contos machadianos pra ler, e estava começando a avaliar se era realmente amor o que eu sentia pela guria... é, acho que não tenho mais muita coisa o que fazer.


Eu desisti de Engenharia. Até hoje não consegui terminar de ler Machado de Assis. Nunca mais vi a menina. Até a vejo todo dia, mas agora é outra.
Comecei a fazer Jornalismo mais por inércia do que por necessidade, conheci um autor chamado James Joyce e no meio desses novos projetos de meia-tigela, não dou mais responsabilidades aos sentimentos - quase um desprojeto, mas não deixa de ser, né?
Sempre me vem à cabeça, agora não uma canção, mas um trecho de um autor.

"Não existe meio de verificar qual é a boa decisão, pois não existe termo de  comparação. Tudo é vivido pela primeira vez e sem preparação. Como se um ator entrasse em cena sem nunca ter ensaiado. Mas o que pode valer a vida, se o primeiro ensaio da vida já é a própria vida? É isso que faz com que a vida pareça sempre um esboço. No entanto, mesmo "esboço" não é a palavra certa porque um esboço é sempre um projeto de alguma coisa, a preparação de um quadro, ao passo que o esboço que é a nossa vida não é o esboço de nada, é um esboço sem quadro."
    - A Insustentável Leveza do Ser

Lindo, não?

Eu nunca mais me atrevi a fazer projetos claros. Apesar dos projetos terem me dado a oportunidade de saber de coisas que hoje me fazem parecer inteligente, não vale muita coisa, sabe? Todos esse livros e essas mágoas de mulheres dão muito assunto para conversar em bares e em paradas de ônibus.  E nada mais.
Desde que não se ache que já se viveu tudo o que se tinha pra viver e use isso para achar que já sabe tudo sobre como viver pelo resto da vida, pode-se ficar tranqüilo.
hahahahaahaha Mas quem fica tranqüilo? Tentar explicar como é a vida baseado nas míseras coisas que conseguimos fazer faz parte. Não sei mais o que falar.

O resto da vida está todo aí, mas parece que perdemos todo o ânimo na realização do último projeto. Eu acho que perdi, da minha parte. Estou me sentindo sem forças. Deixe-me sozinho por agora. Preciso beber um pouco e escutar uma boa música.


Amanhã pela manhã, num acesso de coragem, vou fazer algo diferente, vou embora!


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Certo, segunda-feira é o dia do Murilo, nera não? Pois, para quem não se lembra, ou ainda quem não viu, oia o que foi que a gente inventou de fazer!

Um comentário:

  1. "...até hoje procuro minha sanidade pelas esquinas."

    Fiquei lembrando de quando te conheci, estudando na biblioteca, já pensando em ir para o Jornalismo...
    Muito bom seu texto, :***

    Késsia.

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